"Em algo tão pequeno como uma lágrima, cabe algo tão grande
como um sentimento."
No
sexto e último livro do “Visnhu Purâna”, uma espécie de bíblia hinduísta, o
mestre Parashara descreve ao discípulo Maytreia o que seria nossa época, os
dias de hoje, fase final de Kali Yuga – época de dissolução de um período
evolutivo que ciclicamente se degrada para dar condição a um novo de se
iniciar. Estaríamos assim vivendo, segundo Parashara, momentos de purgação em
que as escórias de um longo processo se destroem, umas às outras. Naturalmente,
como nada se cria e nada se destrói, os resíduos decompõem e se mesclam para
possibilitar nova vida.
O
mestre explica: “Haverá governantes reinando sobre a terra, pessoas de espírito
mau e carácter violento, voltados à mentira e à perversidade... Apoderar-se-ão
dos bens de seus governados... Seus desejos serão insaciáveis. Gente de várias
partes se unirá a eles e seguirá o mau exemplo...
A
riqueza e a piedade diminuirão até que o mundo se depravará por completo... A
classe será conferida unicamente pelos haveres materiais; a riqueza será a
única fonte de devoção; a paixão, o único laço de união entre os sexos; a
falsidade, o único factor de êxito nos litígios; as mulheres serão usadas
unicamente como objecto de satisfação sensual... A aparência externa será o
único distintivo das diversas ordens de vida; a falta de honestidade, o meio
universal de subsistência; a liberalidade valerá como devoção; o homem rico
será reputado puro; o consentimento mútuo substituirá o casamento; os trajes
caros constituirão a dignidade... Reinará o que for mais forte; o povo, não
podendo suportar os impostos e a exploração, se refugiará nos vales mais
distantes...
Assim,
nessa época (Kali Yuga) a decadência prosseguirá sem detença até que a raça
humana se aproxime da aniquilação...”
Ainda
o texto explica que a situação ficará tão crítica e extrema que um poderoso
avatar descerá à Terra para restabelecer a justiça e manter viva a semente da
humanidade ameaçada de extinção.
Daí
os homens (remanescentes) serão sementes de seres humanos de uma nova raça,
aperfeiçoada e sábia, liberta de valores materiais, muito mais espiritualizada.
A
doutrina hinduísta abarca milhões de anos e os divide em períodos ou “rondas”,
sem economia de biliões de anos. Muito complexo de se sintetizar numa página e
de se compreender à luz de nossa cultura “ocidental”. Enciclopédicos compêndios
da doutrina indo-ariana dissecam a cosmogonia do universo, praticamente
ignorada pela doutrina judaico-cristã. Quem se vale dos conhecimentos do
“orientalismo”, além de ampliar o entendimento da doutrina judaico-cristã e de
compreendê-la mais profundamente, costuma se atrasar em discussões menores.
Poderia
dar-se o exemplo do recluso numa prisão que, ao ganhar o ar livre, deixa para
trás os antigos companheiros de cela para desfrutar de liberdade incondicional,
num ambiente mais acolhedor, mantendo um sentimento de compaixão para aqueles
que ficaram no cativeiro e dele estão isolados.
São
relativamente poucos aqueles que procuram gastar seu tempo na missão de
difundir a doutrina indo-ariana e tibetana, até porque acaba falando sânscrito
onde o sânscrito nem sequer é catalogado como língua existente. Dessa forma, os
ensinamentos correm em círculos “esotéricos”, quer dizer, “para poucos e que se
prepararam”.
Existe
também o caminho no cristianismo “esotérico”, de aspectos mais elevados, mas
tão minoritário e mal compreendido que acaba se isolando em mosteiros e
claustros cumprindo com seu ofício de preservar as sementes.
Vale
a pena lembrar que nas leituras teosóficas, com destaque para os quatro
Evangelhos interpretados pelo iluminado Rudolf Steiner, pode-se encontrar a
junção e a complementação das religiões. Disso se pode compreender o
relativismo do materialismo, que serve a um escopo específico e fundamental,
mas, insustentável por si só, é destinado depois a se dissolver como já se
dissolveu a bíblica Babel.
PUBLICADO EM 23/03/14 - vittorio medioli "jornal O Tempo"
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